para laura.
em 1998 quando encontraram
o corpo gay de matthew shepard
sua cara tinha sangue por todo lado
menos duas listras
perpendiculares
que era por onde suas lágrimas
haviam escorrido
naquele dia o ciclista
que o encontrou não
ligou logo que o viu pra polícia
porque o corpo de matthew
estava tão deformado
que o ciclista achou ter visto
um espantalho
sábado passado em são paulo
um grupo de homens
e dois PMs mataram laura
não sem antes
torturá-la laura
foi vista ainda viva
por outro sujeito
que gravou
e postou no youtube o vídeo
de uma laura desorientada
e quem não estaria
com sangue jorrando da boca e da parte
de trás do vestido?
laura tem um corpo
e um nome que lhe pertencem
laura de vermont (presente!)
foi assassinada
por homens
pelo estado
e pela nossa indiferença
aos 18 anos
num sábado.
for laura.
in 1998 when they found
the gay body of matthew shepard
his whole face was bloodied
but for two stripes
perpendicular
where his tears
had flowed
that day the cyclist
who found him did not
call the police immediately
because the body of matthew
was so disfigured
that the cyclist thought he’d seen
a scarecrow
last saturday in são paulo
a group of men
and two Military Police killed laura
not without first
torturing her laura
was seen still alive
by some guy
who recorded
and posted on youtube the video
of a laura disorientated
and who wouldn’t be
blood spewing from the mouth and from the back
of the dress?
laura has a body
and a name that belong to her
laura de vermont (present!)
was murdered
by men
by the state
and by our indifference
at the age of 18
on a saturday.
piriguetismo de guerrilha.
(pra maria felipa)
diz que em nome da independência
maria felipa deu surra
de cansanção nos portugueses
tentando salvar salvador
e outras terras da sanha
dos homens brancos
era quando tiravam a roupa
crente que fornicariam que felipa
incendiava as caravelas
maria felipa seduzia como os librianos
(‘distract and destroy’) adiantando em 100 anos
a tática hoje conhecida como black bloc
se cobain fosse vivo certeza
que seria para ela aquele refrãozinho
‘polly wants a cracker’
(aquela história da moça que seduz
o algoz e se liberta e depois conta
a história para ouvidos moucos
como é o caso de maria felipa
cujo ato de piriguetismo de guerrilha
é conhecido e celebrado por poucos)
passados 100 anos eu que te dou
uma surra não de erva (e sim aquela)
para salvar a mim mesma do espanto
tua república de coxinhas não
aceita a minha, de nordestinos-mortadela,
mas quizá a zika nos igualará todos,
micro- ou anencéfalos, só eu e tu
seguiremos trepando, coquetel molotov
das trevas, fertilizas com teu esperma
todas as minhas capitanias até
que essa era ganhe o nome de cidade
sulista, ‘nova idade média’.
guerrilla bitchcraft.
(for maria felipa)
it is said that in the name of independence
maria felipa beat the shit out
of the portuguese with giant nettles
trying to save salvador
and other lands from the yoke
of white men
it was when they took their clothes off
believing they’d be fucking that felipa
set the caravels on fire
maria felipa would seduce like Librans do
(‘distract and destroy’) anticipating by 100 years
the tactics now known as black bloc
had cobain been alive certainly
that little refrain would have been meant for her
‘polly wants a cracker’
(that story of the girl who seduces
the torturer and unshackles herself then tells
the story to deaf ears
as is the case of maria felipa
whose act of guerrilla bitchcraft
is known and celebrated by few)
fast forward 100 years and it’s me beating the shit
out of you though not with the weed (yep that one)
to save myself from dread
your republic of deep fried coxinhas won’t
accept mine, of northeastern mortadella,
but perhaps zika will level us all
micro- or anencephalic, just you and i
left fucking, molotov cocktail
of darkness, fertilising with your sperm
all my captaincies until
this era is named after a southern city,
‘new middle ages’.
Adelaide Ivánova
Tradução: Francisco Vilhena
Colagem: Ricardo Marques
Adelaide Ivánova (1982, Recife) é uma militante e jornalista brasileira que trabalha com poesia, fotografia, tradução e editoração. ´Ela publicou 3 livros -- autotomy (...) (São Paulo: Pingado-Prés, 2014), Polaróides (Recife: Césarea, 2014) e O martelo (Lisbon: Douda Correria, 2016/Rio de Janeiro: Garupa, 2017) -- e no momento edita o zine anarco-feminista MAIS PORNÔ, PVFR!, com poesia erótica em português e traduzida. Seu trabalho mais recente, The artist is not present -- no qual ela pensa sobre a precariedade da vida da artista, sob uma perspectiva feminista e marxista, mistura texto, som e uma documentação do seu trabalho como modelo viva na Alemanha -- está no momento em exibição no Centro Cultural Hélio Oitica, no Rio de Janeiro. Ivánova vive entre Colônia e Berlim.
Adelaide Ivánova (1982, Recife) is a Brazilian activist and journalist working with poetry, photography, translation and publishing. She has published 3 books -- autotomy (...) (São Paulo: Pingado-Prés, 2014), Polaróides (Recife: Césarea, 2014) and O martelo (Lisbon: Douda Correria, 2016/Rio de Janeiro: Garupa, 2017) -- and currently edits the anarchist-feminist zine MAIS PORNÔ, PVFR!, with erotic poetry in Portuguese and in translation. Her most recent work, The artist is not present -- in which she thinks about the precariousness of the art worker's life, under a feminist and Marxist perspective, mixes text, sound and a documentation of her work as live model in Germany -- is current showing at Centro Cultural Hélio Oitica, in Rio de Janeiro. Ivánova lives between Cologne and Berlin.